O Brasil e a minha vida

(Aluna: Mariana dos Santos Takahashi)


 

Em meu quarto, sentado em minha velha cadeira de descanso, lia uma das minhas mais antigas revistas. Enquanto folheava as páginas, um anúncio me chama atenção. As palavras “Japão” e “Brasil” se encontravam juntas. Era um anúncio de viagens, oferecendo passagens de ida e volta, do Brasil ao Japão. Memórias invadiam-me, deixando-me pensativo. Meus olhos, então já marejados, se fixaram na bandeira japonesa. O vermelho me trouxe tormento, o branco me trouxe paz. Triste ou feliz, essa é a minha história, de como em meados da década 40 eu chegara ao Brasil.

Era um dia como outro qualquer do ano de 1939. Conversando com meus pais, falei da minha decisão de alistar-me nas forças armadas. Tínhamos muito medo, mas o fato é que eu já estava com 17 anos e, aos 20, eu teria que obrigatoriamente que fazer isso. Alistei-me e não demorou muito até que me convocassem para prestar os serviços militares. Mandaram-me para a Marinha, área de meu interesse e lá recebi treinamento visando a guerra. Durante esse tempo, conheci muitas pessoas, fiz amigos. Eles me ensinaram de tudo, desde como usar radares até fazer os mais complicados cálculos. Ficamos todos numa espécie de pensão, em treinamento, até que estivéssemos prontos.

Quando a guerra chegou, todos nós estávamos teoricamente preparados. Em meio a tiros, bombas, granadas, explosivos e afins, lá eu estava, batalhando naquela guerra estúpida pelo meu país. O número de mortos era extremamente assustador, principalmente porque muitos dos mortos eram meus amigos. O medo e a apreensão tomavam conta de mim, que milagrosamente resisti a tudo por 6 longos sofríveis anos.

Quando a guerra finalmente terminou, não me restou nada além de minha família. Os lugares estavam em ruínas, completamente devastados, sem as mínimas condições de habitação. Enquanto caminhava pelos destroços, observando a destruição, ouvi um homem anunciar um navio para imigração. Interessei-me de imediato. Na época, Brasil era conhecido como “o país das oportunidades”. Pedi um folheto, li com atenção e tomei a decisão: levantar âncoras e navegar rumo Brasil. Saímos de casa e embarcamos no navio com pouca bagagem, muita esperança.

A brisa batia em meu rosto e eu observava o Japão ficando distante, quase como se desaparecesse. Minha mãe me abraçou, me confortando em seus braços e eu senti que, de alguma forma, tudo ficaria bem. A viagem durou cerca de 45 dias abordo de um pequeno navio. Felizmente, em meio a tristeza que a guerra causou, comecei a perceber novamente a docilidade, pois os outros imigrantes eram gentis e quase todos tinham o mesmo objetivo que eu: recomeçar.

Desembarcamos em Santos e logo me surpreendi com o lugar. Grande, bonito...Não conseguia pensar em mais adjetivos. Meus olhos se maravilharam com a paisagem e com a fauna, que eram completamente diferentes do meu país de origem. A flora era deslumbrante. Árvores enormes e flores de todas as cores coloriam todo o lugar. As pessoas foram receptivas e hospitaleiras.

Assim que o transporte chegou, me tirando atenção da paisagem, nós embarcamos e fomos para uma pensão. Após nos acomodarem em quartos, descemos para comermos algo. Lá, um senhor oferecia trabalho aos recém-chegados. Apressei-me e consegui uma vaga, seria lavrador em uma grande fazenda. Logo tomei gosto pelo meu novo trabalho. Lá eu permaneci até que tivesse condições para me mudar pra cidade grande, mais especificamente para Belo Horizonte.

Sou interrompido das minhas recordações quando minha neta aproximasse e pede para fazer uma entrevista comigo, para trabalho escolar. Que coincidência! “Claro, vamos à entrevista”. Nesse momento foi que percebi que, por não sei quantos minutos, eu me perdi em devaneios do passado, lembrando-me de como aqui cheguei. Passei uma página, e vi uma foto: meus pais, eu e outros imigrantes.

Olhei para minha netinha e uma lágrima desceu meu rosto. Percebi como minha vida mudou desde que vim para o Brasil. Aqui conheci minha esposa, meus amigos e construí uma maravilhosa família. Com certeza, vir ao Brasil foi minha melhor escolha.


 

(Texto baseado na entrevista com o senhor Shoei Takahashi.)

 

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